É raro, mas acontece muito….

Algumas aves são comuns, outras são raras. É muito comum tentar registrar as últimas, mas não raro voltamos para casa somente com registro das primeiras.

Porém, quando passamos bastante tempo sem observar e fotografar aves, essa distinção perde um pouco o sentido e o que a gente quer mesmo é que os bichos apareçam, além de curtir a caminhada, o ar puro e toda aquela conversa leve que normalmente envolve uma saída a campo.

Recentemente, fui ao Parque Estadual do Turvo – PET – para reencontrar as aves e, ainda que tivesse vontade de fotografar novas espécies, tinha como objetivo fazer as melhores fotos possíveis da maior quantidade de espécies possível, fossem raras ou comuns, lifer ou não.

Por isso, o dia foi escolhido com base na previsão do tempo. O frio era esperado, mas queria evitar umidade e chuva e até mesmo muitas nuvens. Depois de organizar os detalhes, conversei com o amigo Dante, que conhece o PET e suas aves como poucos, para que ele me acompanhasse como guia. Infelizmente, ele não pôde me acompanhar naquele dia.

Ele mesmo lembrou que o Carlos Neimar, outro amigo que as aves me permitiram conhecer, poderia passarinhar comigo. O Carlos também conhece muito bem o Turvo e tem um grande conhecimento a respeito das suas aves. Faltava, então, decidir se eu manteria o plano ou adiaria a saída. Afinal, para quem está há quase dois anos sem ir a campo, não custa nada esperar mais um pouco. Conversei com o Carlos e ele disse que poderia me acompanhar. Então: vou ou não vou? Eis a questão!

Bons motivos para ir não faltavam: eu já havia organizado a logística e feito os arranjos familiares. A previsão de bom tempo se mantinha e, além disso, o Turvo é o Turvo e sempre vale a pena ir visitá-lo. Por outro lado, pensava em ter que acordar cedo e, principalmente, no frio que teria que enfrentar, além de saber que é bastante cansativo ir e voltar do PET no mesmo dia, principalmente sem ninguém para conversar durante a viagem e espantar o sono.

Os argumentos contrários eram apenas desculpas e, no final das contas, decidi manter o planejamento e às 5h da manhã lá estava eu partindo em direção ao grande salto e imaginando que surpresas o dia me reservava.

O Carlos me pedira a lista das espécies que ocorrem no parque que eu ainda não havia registrado. Elaborei a tal lista, mas deixei claro que “o que viesse seria lucro”, até porque gostaria de fazer fotos melhores de muitas das espécies que eu já conhecia. De qualquer forma, fomos parando nos lugares que poderiam render alguns lifers, chamando os bichos, parando para ouvi-los.

Fazíamos o que estava a nosso alcance e o Carlos claramente estava interessado em me ajudar a encontrar as espécies da minha lista, mas o Turvo estava quieto, tímido, reservado. Depois de alguns Beneditos-de-testa-amarela darem o ar de sua graça, trazendo, de fato, um pouco de graça para a nossa saída, demorou até que outras aves se apresentassem, mesmo nos lugares onde normalmente elas podem ser encontradas.

Casal de Benedito-de-testa-amarela (Melanerpes flavifrons) alegrando a calma manhã no PET.

É engraçado como nossa cabeça não para de funcionar e enquanto a gente seguia pela estrada do salto me ocorria que talvez tivesse sido melhor ter deixado a passarinhada para outro dia, pois o frio parecia estar deixando as aves mais acomodadas. Pensava também no longo caminho de volta e nos afazeres do dia seguinte. Preparado e buscando não dar chances para o “amadorismo”, eu havia carregado duas baterias e esvaziado dois cartões de memória, mas até ali a bateria continuava cheia e os cartões, vazios!

O jeito era continuar curtindo a liberdade momentânea e aproveitar ao máximo esse contato com a natureza que, por diversos motivos, tornara-se escasso.

E foi assim que, depois de mais alguns registros, incluindo dois lifers, chegamos à área de lazer do Parque, quando a perspectiva de saborear um sanduíche e o som da impontente queda longitudinal reanimaram este observador/fotógrafo.

E, foi justamene quando estava sem a minha câmera – e com a boca cheia de sanduíche – que o Carlos avistou um gavião pousando em um Canafístula. Notei a agitação dele e do seu colega Alonso, que também se tornou observador de aves, e fui buscar a câmera. O Carlos falou que se tratava do Gavião-miudinho e, de início, admito que o confundi com o Gavião-miúdo, mas logo fui alertado de que era “o outro, aquele que é mais raro”.

Acontece que o Gavião-miudinho faz jus ao nome e, mesmo sabendo que ele estava ali, foi difícil localizá-lo. Além disso, o seu comportamenteo furtivo, típico de predador, também dificulta a sua localização.

Depois de permitir as primeiras fotos, ele voou e trocou de poleiro, permitindo mais uma sequência de fotos. Em seguida, uma nova troca de poleiro e eu me preparei para fazer fotos em voo, pois estava claro que ele não tinha a intenção de permanecer pousado por muito tempo. Ele voou mesmo, mas para “o outro lado”, em direção à mata, sem permitir as desejadas fotos em voo.

O belo e raro Gavião-miudinho (Accipiter superciliosus), também chamado de Tauató-passarinho.

Na sequência, passamos à identificação, buscando confirmar que realmente se tratava do Accipiter superciliosus e, para a nossa alegria, o registro se confirmou, embora ainda pretendêssemos aguardar pela opinião dos amigos com maior conhecimento.

O encontro com esse gavião incomum mostrou que, quando se trata de sair para observar aves, principalmente no PET, não se deve deixar para depois, mas sim voltar quantas vezes for possível. Mostrou que o observador de aves deve sempre estar atento e que é preciso reconhecer o privilégio que é poder praticar a observação de aves em um lugar tão especial.

Algumas espécies são raras, mas o prazer de observar aves acontece muito. Sempre, aliás!

Autor: Adaltro C Zorzan

Sou apaixonado por aves e fotografia, embora minha área de formação seja outra. No meu tempo livre, costumo ir a campo, de câmera em punho, para passarinhar. Apesar da limitação pessoal e do equipamento, busco sempre trazer no cartão de memória a melhor imagem possível de cada ave encontrada.

2 comentários em “É raro, mas acontece muito….”

  1. Olá , que lindo este relato de passarinhada , devemos seguir o coração e não ligar tanto para o raciocínio que está sempre questionado as vontades do coração que nos levam a tão belas e simples vivências . Abraço

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